Nome:
Guilherme Estevam Emilio – Ponto Missionário da Igreja Metodista em Sumaré.
Carta Pastoral sobre os Sacramentos
Introdução
Diante de um cenário
religioso diferente do contexto em que viveu João Wesley, a Igreja Metodista,
por meio do Colégio Episcopal (2001), decidiu elaborar uma Carta Pastoral sobre
os Sacramentos. Num contexto em que poucos evangélicos sabem o que significa “sacramento”,
quais são os dois sacramentos protestantes que se mantém na tradição
protestante e quais os demais sacramentos católicos que não se mantiveram,
fez-se necessário orientar a Igreja Metodista sobre o assunto.
Os protestantes
concebem os sacramentos como “sinais visíveis da graça invisível de Deus”.
Sinais esses de uma obra que já foi feita por Jesus e que, quando atualizada
por nós e em nós, traz à tona símbolos concretos de sua concreta existência.
A problemática da Carta
Pastoral, relevada em nosso contexto, consiste no fato de que muitos
pentecostais e neopentecostais tem nos criticado por duas razões simples: a)
porque batizamos crianças; e b) porque aceitamos as três formas de batismo.
Para eles, crianças não podem ser batizadas, e o batismo só pode ser válido se
feito por imersão. Isso porque eles estão inseridos numa tradição anabatista e
batista que considera que a criança não tem fé para ser batizada e, ao mesmo
tempo, é demasiadamente pura para ser regenerada e purificada. Como se sabe, os
batistas crêem que no ato do batismo acontece a própria regeneração e que, para
se batizar, é necessário, antes, confissão de pecados e arrependimento. Isso
nos põe diante de um impasse, pois, para os protestantes históricos, a graça de
Deus precede o batismo, e a mudança de vida sucede o batismo; não o contrário,
como defendiam os anabatistas.
Essa discussão entre
anabatistas e pedobatistas existe há muitos séculos e até hoje perdura. Por um
lado, alguém diz que o batismo é a própria regeneração e que para ser
regenerado é necessário confessar os pecados ao Senhor Jesus; por outro, diz-se
que o batismo é sinal de graça, e não a própria regeneração, que deve ser
realizado naqueles que participam do Corpo de Cristo e do Reino de Deus.
Afinal, o que os metodistas têm a dizer diante dessa controvérsia?
1
A posição Metodista sobre o batismo
De saída, os autores da Carta Pastoral
expõem que o batismo, na nova aliança em Cristo, substituiu o sinal de pacto
com Deus que a circuncisão representou no Antigo Testamento: “Nele também
fostes circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo
da carne, que é a circuncisão de Cristo; tendo sido sepultados juntamente com
Ele no Batismo, no qual igualmente fostes ressuscitados mediante a fé no poder
de Deus que o ressuscitou dentre os mortos” (Cl 2.11-12). Esse argumento,
apesar de não constar essa informação na carta pastoral, fora um argumento
importante utilizado por Calvino em suas Institutas
para convencer os anabatistas da Suiça a adotarem o pedobatismo. Calvino
compreendia que a mudança de vida sucede o batismo, e não o contrário, como
defendiam os anabatistas.
Os batistas de hoje insistem que, caso o
argumento da circuncisão seja rejeitado, já não temos mais razões para cremos
no batismo infantil. No entanto, a Igreja Metodista elaborou um importante
documento mostrando uma série de argumentos favoráveis ao batismo infantil.
Ademais, a igreja também argumentou em favor da pluralidade de formas de
batismo.
Segundo os Cânones da Igreja Metodista, “o
Batismo é sinal visível da graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual nos
tornamos participantes da comunhão do Espírito Santo e herdeiros da vida
eterna”. Ele é realizado “com água, em nome do Pai, do Filho e do Espírito
Santo, com aspersão (aplicando água com a mão sobre a cabeça do batizando),
derramamento (com ambas as mãos, derrama-se água sobre a cabeça do batizando,
estando este, geralmente, com parte do corpo dentro da água) e imersão (o
batizando é submergido na água). Com efeito, a Igreja Metodista reconhece como
válido as três formas de batismo.
A Carta Pastoral sobre os sacramentos
divide-se em dois momentos, a saber: a parte sobre o batismo e a parte sobre a
Ceia do Senhor. Veremos, contudo, apenas a parte sobre o batismo.
A)
Batismo
no Antigo Testamento
1.
As águas eram utilizadas, no Antigo
Testamento, nos rituais de purificação de pecado, ex.: o banho que o sacerdote
tomava no lugar santo antes de oferecer holocausto (Lv.16.15-28).
2.
Ezequiel diz que toda a cidade de
Jerusalém, inclusive crianças e mulheres, deveria ter sido lavada com água para
a purificação, quando ela foi conquistada pelos judeus.
3.
Uma família purificada não aceitava
nenhum membro impuro, seja criança ou escravo. E, portanto, todos deveriam ser
purificados.
4.
Havia três exigências àquele que
adentrava à comunidade judaica: a circuncisão, o batismo e a oferta de
sacrifício. Isso começou no período pós-exílico.
5.
O Talmud, um dos principais documentos
judaicos que discute as leis da Torah, alega que as pessoas eram batizadas na
infância, antes dos doze anos, com autorização dos pais e da sinagoga.
B)
Batismo
no Novo Testamento
1.
Os primeiros convertidos, em Atos,
levavam toda sua família para ingressarem na fé cristã. Lídia, por exemplo, foi
batizada com toda a sua casa (At 16.15); o carcereiro se converte e todos os
seus são batizados (At 16.33).
2.
Na Igreja em Corinto, Estéfanes e sua
casa foram batizados por Paulo. Ademais, Crispo e toda a sua família também o
foram (At 18.8).
C)
Principal
argumento batista
As crianças não podem
exercer uma fé pessoal em Jesus
Cristo, aceitando-o como Senhor e Salvador, e por isso não devem ser batizadas.
Texto bíblico: Marcos 16.16: “Quem crer e for batizado será salvo; quem não
crer será condenado”.
D)
Objeções
Metodistas
O texto pode ser usado
para falar sobre o batismo infantil? Não, pois Jesus está se referindo a
adultos que ouvem, entendem e rejeitam o Evangelho, não se trata de crianças.
E o que Jesus fala
sobre as crianças?
“Deixai vir a mim os
pequeninos, não os embaraceis porque dos tais é o Reino de Deus” (Mc 10.13).
Essa afirmação de Jesus mostras que as crianças são membros do Reino de Deus e,
além disto, padrão para ingresso no Reino. Por isso, Jesus disse: “Qualquer que
receber, em meu nome, uma criança tal como esta, a mim me recebe”.
Questão: Diante disso,
perguntamos como Pedro o fez aos seus companheiros na casa de Cornélio:
“Porventura pode alguém recusar a água, para que sejam batizados estes que,
assim como nós, receberam o Espírito Santo?” (At 10.47). Com efeito, como negar
o batismo às crianças quando Jesus declara que delas é o Reino? Não é o batismo
um ritual simbólico de iniciação na comunidade do Reino de Deus: a Igreja?
Além dessas questões
levantadas na Carta Pastoral, poderíamos fazer muitas outras objeções. O texto
bíblico de João 3.18 diz que quem não crê em Jesus já está condenado,
referindo-se ao presente. Se entendermos que a criança não é capaz de crer em
Jesus, nesse caso, também deveríamos considerá-la condenada, já que julgamos
que ela não crê o suficiente para ser batizada. No entanto, como alguém que não
crê pode ser portadora do verdadeiro louvor a Deus? Parece que o argumento
batista tira o sentido das palavras de Jesus sobre as crianças, deixando a
entender que elas são piores do que aqueles que têm melhor capacidade de
compreensão. Será que a fé depende da compreensão ou a compreensão depende da
fé? Segundo a tradição protestante, a fé é dom de Deus, pois: “pela graça somos
salvos por meio da fé, isso não vem de vós, é dom de Deus” (Ef 2.9).
Enfim, não há sentido
em negar um sacramento a uma criança pela fato dela não poder compreender a
graça de Deus, já que:
a) a compreensão não significa fé
verdadeira;
b) não podemos delimitar a idade certa
que uma criança está apta a compreender;
c) não temos subsídios bíblicos para
delimitar o ano que a criança poderá ser batizada, pois a Bíblia não proíbe o
batismo infantil;
d) há mais elementos bíblicos favoráveis
ao batismo infantil do que contrários;
e) o batismo de Jesus – exemplo usado
pelos batistas – foi realizado somente quando ele tinha 30 anos e, portanto,
não se deve batizar antes dos 30, quando se utiliza esse tipo de argumento;
f) o batismo de Jesus não deveria ser
para purificação dos pecados, já que Jesus não tinha pecados, mas para cumprir
a Lei.
g) Ao imitarmos a mãe de Jesus
apresentando uma criança ao Senhor, deixamos de imitá-lo integralmente, pois
Jesus foi circuncidado também ao oitavo dia e nem por isso devemos nos
circuncidar.
Diante disso, dificilmente poderíamos
sustentar qualquer argumento batista que tentasse utilizar a Bíblia para negar
o batismo infantil, pois, como já mostramos, há muitos textos que,
implicitamente, supõem o batismo infantil ao dizer que “todos da sua casa foram
batizados”. Caso contrário, a Bíblia teria sido clara, especificando aqueles
aos quais deveríamos negar o batismo ou colocando alguma oração coordenada
adversativa.
A Igreja Metodista, com
efeito, assume oficialmente que é favorável ao batismo infantil e, no que diz
respeito à forma do batismo, reconhece como válido o batismo por aspersão, por
derramamento e por imersão.
2.
Argumento
Batista e contra-argumento Metodista
Os imersionistas
baseiam-se no sentido da palavra grega “baptizo” que quer dizer “imergir”.
Argumentam também que a narrativa do Batismo de Jesus, que diz “no rio Jordão”
e “ao sair da água” indica que o batismo foi imersão. Se admitirmos esse
argumento, seremos obrigados a crer que tanto o batizando como o oficiante
deveriam, ambos, imergirem, tomando por base o relato do batismo do eunuco por
Felipe (At 8.38), pois o texto diz que “ambos desceram às águas” e que “ambos
saíram das águas”. Ora, se isto quer dizer que o Eunuco foi mergulhado, então Felipe
também mergulhou. Com efeito, cada fez que o oficiante celebrar um batismo
deverá também imergir juntamente com o batizando.
A força desse argumento
favorável somente à imersão está no sentido do nome grego. No entanto, a
palavra grega baptizo tem diferentes
usos e sentidos na Bïblia, como por exemplo em Lc 11.37-39, que faz referência
à lavagem cerimonial das mãos e dos pés; em Mc 7.1-7, referindo-se à lavagem de
copos, jarros e vasos; em I Co 10.2, em que Paulo descreve a passagem dos filhos
de Israel pelo mar como sendo um batismo na nuvem e no mar. No entanto, a
lavagem de jarros, das mãos e dos pés é um tipo de lavagem, não uma imersão.
Ademais, os judeus atravessaram o mar com pés secos, como diz o texto de Êx
14.29. Com efeito, parece evidente que o uso bíblico do termo “baptizo” não tem sentido de imersão. E,
portanto, não basta apenas utilizar o significado do termo para defender uma
forma exclusiva de batismo, pois o próprio termo, quando usado na Bíblia,
aponta para outras formas.
No Antigo Testamento, o
batismo era um símbolo de purificação de pecado e poderia ser feito também por
aspersão (Jo 2.6). No Novo Testamento, quando foram batizados três mil pessoas
em Jerusalém, numa região onde a água era escassa e proveniente de poços, dificilmente
as pessoas teriam sido batizadas por imersão.
Wesley afirma: “pela lavagem, imersão ou
aspersão, porque a Escritura não determina qual destes meios ser usados, quer
por preceito expresso, quer por um exemplo claro que o provê, quer ainda pela força
ou pelo significado da palavra batizar...” (Coletânea da Teologia de João
Wesley, p.273).
3.
Contra-argumento
protestante
Para Lutero, o batismo
é o grande testemunho da salvação pela graça. Nos Catecismos Maior e Menor e na
obra chamada Cativeiro Babilônico, Lutero apresenta didaticamente como se deve
batizar as crianças e os argumentos revelando que Deus aprova o batismo
infantil. Lutero diz que não é a fé que confere eficácia ao ato batismal, mas a
Palavra de Deus. Ele se opõe aos entusiastas que condicionam a eficácia
batismal à fé e argumenta: “... se eu não creio, segue-se que Cristo nada
é...”, neste sentido ele antepõe a própria fé, a revelação de Deus em Cristo e
a graça sem as quais não haveria no que se crer, e mostra que o batismo é um
sinal visível da graça de Deus.
4.
A
responsabilidade dos pais e da igreja para com as crianças
A Carta Pastoral
termina essa primeira parte sobre o batismo afirmando que os pais e a igreja
local devem assumir a responsabilidade e o compromisso de zelar pela vida espiritual
das crianças que são batizadas.
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